quinta-feira, 28 de julho de 2011

Marina Colassanti

Acordava ainda no escuro, como se ouvisse o sol chegando atrás das beiradas da noite. E logo sentava-se ao tear.

Linha clara, para começar o dia. Delicado traço cor da luz, que ela ia passando entre os fios estendidos, enquanto lá fora a claridade da manhã desenhava o horizonte.

Depois lãs mais vivas, quentes lãs iam tecendo hora a hora, em longo tapete que nunca acabava.

Se era forte demais o sol, e no jardim pendiam as pétalas, a moça colocava na lançadeira grossos fios cinzentos  do algodão  mais felpudo. Em breve, na penumbra trazida pelas nuvens, escolhia um fio de prata, que em pontos longos rebordava sobre o tecido. Leve, a chuva vinha cumprimentá-la à janela.

Mas se durante muitos dias o vento e o frio brigavam com as folhas e espantavam os pássaros, bastava a moça tecer com seus belos fios dourados, para que o sol voltasse a acalmar a natureza.

Assim, jogando a lançadeira de um lado para outro e batendo os grandes pentes do tear para frente e para trás, a moça passava os seus dias.

Nada lhe faltava. Na hora da fome tecia um lindo peixe, com cuidado de escamas. E eis que o peixe estava na mesa, pronto para ser comido. Se sede vinha, suave era a lã cor de leite que entremeava o tapete. E à noite, depois de lançar seu fio de escuridão, dormia tranqüila.

Tecer era tudo o que fazia. Tecer era tudo o que queria fazer.

Mas tecendo e tecendo, ela própria trouxe o tempo em que se sentiu sozinha, e pela primeira vez pensou em como seria bom ter um marido ao lado.

Não esperou o dia seguinte. Com capricho de quem tenta uma coisa nunca conhecida, começou a entremear no tapete as lãs e as cores que lhe dariam companhia. E aos poucos seu desejo foi aparecendo, chapéu emplumado, rosto barbado, corpo aprumado, sapato engraxado. Estava justamente acabando de entremear o último fio da ponto dos sapatos, quando bateram à porta.

Nem precisou abrir. O moço meteu a mão na maçaneta, tirou o chapéu de pluma, e foi entrando em sua vida.

Aquela noite, deitada no ombro dele, a moça pensou nos lindos filhos que teceria para aumentar ainda mais a sua felicidade.

E feliz foi, durante algum tempo. Mas se o homem tinha pensado em filhos, logo os esqueceu. Porque tinha descoberto o poder do tear, em nada mais pensou a não ser nas coisas todas que ele poderia lhe dar.

— Uma casa melhor é necessária — disse para a mulher. E parecia justo, agora que eram dois. Exigiu que escolhesse as mais belas lãs cor de tijolo, fios verdes para os batentes, e pressa para a casa acontecer.

Mas pronta a casa, já não lhe pareceu suficiente.

— Para que ter casa, se podemos ter palácio? — perguntou. Sem querer resposta imediatamente ordenou que fosse de pedra com arremates em prata.

Dias e dias, semanas e meses trabalhou a moça tecendo tetos e portas, e pátios e escadas, e salas e poços. A neve caía lá fora, e ela não tinha tempo para chamar o sol. A noite chegava, e ela não tinha tempo para arrematar o dia. Tecia e entristecia, enquanto sem parar batiam os pentes acompanhando o ritmo da lançadeira.

Afinal o palácio ficou pronto. E entre tantos cômodos, o marido escolheu para ela e seu tear o mais alto quarto da mais alta torre.

— É para que ninguém saiba do tapete — ele disse. E antes de trancar a porta à chave, advertiu: — Faltam as estrebarias. E não se esqueça dos cavalos!

Sem descanso tecia a mulher os caprichos do marido, enchendo o palácio de luxos, os cofres de moedas, as salas de criados. Tecer era tudo o que fazia. Tecer era tudo o que queria fazer.

E tecendo, ela própria trouxe o tempo em que sua tristeza lhe pareceu maior que o palácio com todos os seus tesouros. E pela primeira vez pensou em como seria bom estar sozinha de novo.

Só esperou anoitecer. Levantou-se enquanto o marido dormia sonhando com novas exigências. E descalça, para não fazer barulho, subiu a longa escada da torre, sentou-se ao tear.
Desta vez não precisou escolher linha nenhuma. Segurou a lançadeira ao contrário, e jogando-a veloz de um lado para o outro, começou a desfazer seu tecido. Desteceu os cavalos, as carruagens, as estrebarias, os jardins.  Depois desteceu os criados e o palácio e todas as maravilhas que continha. E novamente se viu na sua casa pequena e sorriu para o jardim além da janela.
A noite acabava quando o marido estranhando a cama dura, acordou, e, espantado, olhou em volta.  Não teve tempo de se levantar. Ela já desfazia o desenho escuro dos sapatos, e ele viu seus pés desaparecendo, sumindo as pernas. Rápido, o nada subiu-lhe pelo corpo, tomou o peito aprumado, o emplumado chapéu.
Então, como se ouvisse a chegada do sol, a moça escolheu uma linha clara. E foi passando-a devagar entre os fios, delicado traço de luz, que a manhã repetiu na linha do horizonte.

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Arthur Bispo do Rosário

                                                                

JONAS

Por Vanessa Coutinho

                                                                




A HISTÓRIA DO PROFETA JONAS

            Deus disse ao profeta Jonas que fosse pregar em Nínive, cidade conhecida por sua maldade. Jonas achou que não deveria ir, e embarcou em um navio que zarpava para Társis, bem longe de onde Deus lhe mandara ir.
            Mas Deus lançou sobre o mar um vendaval tão intenso, que o navio estava a ponto de naufragar. Os marinheiros, em desespero, oravam por suas vidas, cada qual segundo sua crença. Jonas, enquanto isso, dormia profundamente no porão. O comandante o encontrou, e lhe disse que também orasse.
            Os homens lançaram a sorte, a fim de saber quem era o responsável pela situação em que se encontravam. Jonas foi apontado e questionado. Cientes de tudo, os marinheiros perguntaram a Jonas o que fazer, e ele disse que deveriam jogá-lo ao mar, o que foi feito.
            Após Jonas ser lançado, o mar se acalmou. E Deus enviou um grande peixe, que engoliu Jonas. Jonas permaneceu nas entranhas do peixe por três dias e três noites. E orou.
            Deus ordenou ao peixe que vomitasse Jonas sobre a terra firme.
            Mais uma vez Deus disse a Jonas que fosse pregar em Nínive, que agora estava bem mais perto do que no começo de sua jornada. E ele foi, e pregou dizendo que, se seus habitantes não cressem em Deus, a cidade sucumbiria em quarenta dias.
            Os homens creram, e jejuaram, inclusive o rei. E Deus não destruiu a cidade.

relação entre o livro de Jonas e os conceitos de “ego” e “self”

            No livro de Jonas, podemos identificar duas figuras principais: o profeta e Deus.
            Podemos identificar o profeta Jonas com o ego, e Deus com o self.
            Deus-self, sabe e indica o caminho que o Jonas-ego deveria seguir: na história em questão, pregar em Nínive. O ego, influenciado por fatores diversos, resolve afastar-se do que seria o seu “mito pessoal”.
            Enquanto dorme, uma tempestade ameaça o navio em que se encontra, mas ele não vê. Por vezes, o adoecimento psíquico apresenta os primeiros sinais, mas o sistema consciente nega, “adormece”, despreza. Então, o self não tem outra alternativa senão apresentar-se em sua plenitude. É a epifania de Deus, e Jonas é engolido por um grande peixe, e passa em seu ventre, que representa o contato com o inconsciente, três dias e três noites. Jonas, como todo herói, vai às profundezas em vida (katábasis) e, após perceber que apenas aceitando ser o que é, poderá retornar seu estado de saúde, ora, entra em relação com Deus, e é vomitado “de volta à vida” (anábasis).


terça-feira, 19 de julho de 2011

PARA LER E PENSAR

Lúcia, aproveitei a frase para o blog. Impossível não fazê-lo...
Bj.

"O que me preocupa não é nem o grito dos corruptos, dos violentos, dos desonestos, dos sem caráter, dos sem ética... O que me preocupa é o silêncio dos bons."
Martin Luther King

                                                    

segunda-feira, 18 de julho de 2011

PARA LER E PENSAR

"Não somos ricos por causa das coisas que possuímos, mas pelo que podemos fazer sem possuí-las"
Kant


                                                  

segunda-feira, 11 de julho de 2011

C. G. JUNG

"Ainda que ocasionalmente os meus pacientes produzam obras de grande beleza, boas para serem expostas em mostras de "arte" moderna, eu as considero totalmente desprovidas de valor artístico, quando medidas pelos padrões da arte verdadeira. É essencial até que não tenham valor, pois, do contrário, meus pacientes poderiam considerar-se artistas, e isso seria fugir totalmente à finalidade do exercício. Não é arte, nem deve sê-lo. É bem mais que isso; é algo bem diverso do que simplesmente arte; trata-se da eficácia da vida sobre o próprio paciente. Aquilo que do ponto de vista social não é valorizado passa a ocupar aqui o primeiro plano, isto é, o sentido da vida individual, que faz com que o paciente se esforce por traduzir o indizível em formas visíveis. Desajeitadamente. Como uma criança."
(A Prática da Psicoterapia)